Page 45 - Revista da Ordem - Edição 35

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O novo processo
civil e a crença
em resultados
Os advogados convivem diaria-
mente com o drama do exces-
so de demandas. Sentem, de
um lado, a pressão dos clientes, que
querem ver suas pretensões atendidas
de forma rápida e eficiente. De outro,
sofrem ao ver a sobrecarga dos juízes, o
que inviabiliza a garantia constitucio-
nal da razoável duração do processo.
Mas a demora não é o único proble-
ma. A falta de efetividade constitui um
dos mais significativos fatores de des-
crédito. Quem é o advogado que nunca
enfrentou algum fracasso no cumpri-
mento de decisões judiciais? Pior do
que esperar, é esperar e não obter. Nes-
te contexto, o que pode ser feito?
Estamos em um novo momento
processual e nossa atuação poderá for-
mar o entendimento da jurisprudência
dos próximos anos. É preciso, então,
agir. Mais do que criticar, é preciso ser te de Processualistas Civis: A aplicação
criativo e encontrar alternativas.
Justamente por isso, as inovações
do Código de Processo Civil, além de
bem-vindas, precisam ser invocadas
pelos advogados. Com efeito, a lei só
se torna efetiva se for exigida e apli-
cada no foro. E, verdade seja dita: o
novo Código traz avanços quanto à
eficácia. A preocupação vem expressa
logo no início: o art. 4º estabelece que
as partes têm o direito de obter em pra-
zo razoável a solução integral do méri-
to, incluída a atividade satisfativa. Ou
seja, não basta a mera declaração do
direito. É preciso que ele se realize na
vida cotidiana das pessoas.
Em termos de cumprimento das
decisões, o legislador felizmente subs-
tituiu as medidas típicas do Código de
1973 por uma espécie de cláusula ge-
ral para a efetividade. Exemplo disso
é o art. 139, IV, que permite a adoção
de todas as medidas indutivas, coer-
citivas, mandamentais ou sub-rogató-
rias necessárias para o cumprimento
de uma ordem judicial. A propósito, a
ENFAM1 aprovou o Enunciado nº 48:
O art. 139, IV, do CPC/2015 traduz um
poder geral de efetivação, permitindo a
1 Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados.
2 A título de exemplo , há três julgados de fevereiro de 2017: A.I. 2211611-
73.2016.8.26.0000; A.I. 2235359-37.2016.8.26.0000 e A.I. 2204898-82.2016.8.26.0000.
3 Novo curso de processo civil: teoria do processo civil. 2ª ed, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, vol. 01, 2016, p. 257.
2017 | MARÇO | REVISTA dA ORDEM
aplicação de medidas atípicas para ga- Rogéria Dotti
rantir o cumprimento de qualquer ordem
judicial, inclusive no âmbito do cumpri- Advogada inscrita na OAB sob o nº 20900
mento de sentença e no processo de exe- Doutoranda e Mestre em Direito Processual
cução baseado em títulos extrajudiciais. Civil (Direito das Relações Sociais) pela
Universidade Federal do Paraná – UFPR
Para garantir pagamentos, come- Professora de Direito Processual Civil e
çaram a surgir medidas polêmicas: Coordenadora Geral da Escola Superior
suspensão de carteiras de habilitação, da Advocacia – ESA (gestão 2013/2015)
apreensão de passaportes e cancela- Secretária-Geral Adjunta do Instituto
mento de cartões de crédito. Elas foram Brasileiro de Direito Processual – IBDP
pensadas, evidentemente, para a ocul- Conselheira da Ordem dos
tação de patrimônio. Mas o Tribunal de Advogados do Brasil, Seccional do
Justiça de São Paulo vem reformando Paraná – OAB/PR (gestões 2004/2006,
essas decisões, por entender que há vio- 2007/2009 e 2013/2015)
lação ao princípio da proporcionalidade Conselheira nata e Ex-Presidente do Instituto
e à garantia de ir e vir (CF, art. 5º, XV)2. dos Advogados do Paraná –IAP (2010/2011)
Autora de diversas obras jurídicas
É certo que tais medidas devem
ser aplicadas apenas subsidiariamen- Estamos em
te, quando os meios convencionais se um novo
mostrarem ineficazes. É o que diz o momento
Enunciado nº 12 do Fórum Permanen- processual e nossa
atuação poderá
das medidas atípicas sub-rogatórias e formar o
coercitivas é cabível em qualquer obriga- entendimento da
ção no cumprimento de sentença ou exe- jurisprudência dos
cução de título executivo extrajudicial. próximos anos. É
Essas medidas, contudo, serão aplicadas preciso, então, agir.
de forma subsidiária às medidas tipifi- Mais do que criticar,
cadas, com observação do contraditório, é preciso ser criativo
ainda que diferido, e por meio de decisão e encontrar
à luz do art. 489, § 1º, I e II. alternativas”.
Nesse sentido, o tempo fará a cor-
reção de alguns abusos. Mas, o que
não se deve admitir é que posturas
conservadoras transformem impor-
tantes dispositivos em letra morta.
Como destacam Marinoni, Arenhart
e Mitidiero, não por acaso a efetivi-
dade compõe o princípio da segurança
jurídica – um ordenamento jurídico só
é seguro se há confiança na realização
do direito que se conhece3. Abstraindo
os excessos, tais decisões buscam im-
plementar o comando das ordens ju-
diciais. Elas resgatam a autoridade e a
força da lei em um triste cenário de in-
subordinação e má-fé. Nesse sentido,
merecem estar no centro das reflexões
e nos requerimentos dos advogados.
Afinal, como disse Vinícius de Moraes,
não há mal pior do que a descrença.