Page 6 - Revista da Ordem - Edição 40
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entrevista | Carlos Velloso
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2017 | agosto | REVISTA dA ORDEM Não temos um Supremo
Tribunal Federal,mas sim
onze Supremos
Numa época em que ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) muitas ve-
zes chamam mais atenção por suas brigas pessoais do que por suas posições
jurídicas, faz falta à mais alta corte do país a firmeza serena, mineira, do ex-
ministro Carlos Mário da Silva Velloso. “Hoje parece que nós não temos um
Supremo Tribunal Federal, mas sim onze Supremos. Isso não está certo”, afir-
ma o ex-ministro, criticando os debates vaidosos e midiáticos dos colegas que atualmente
compõem a corte. Magistrado de carreira, ex-integrante do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ele foi ministro do Supremo Tribunal Federal de 1990
a 2006 (presidente entre 1999 e 2001), até se aposentar da magistratura e se tornar advoga-
do. E foi como advogado que Carlos Velloso encerrou a VI Conferência Estadual da Advocacia
da OAB Paraná falando sobre os novos rumos da democracia e da república no Brasil – tema
que também abordou nesta entrevista à Revista da Ordem.
O Sr. encerra a VI Conferência Estadual de barreira, porque o que é que te- que praticamos é outra coisa que
da Advocacia falando sobre “Um Novo mos no momento? Temos cerca de 30 precisa ser alterada. Nós temos o sis-
Ideário Democrático”. Que aspectos da partidos digladiando no Congresso tema proporcional na eleição para a
nossa democracia não estão a conten- atrás de vantagens! As cláusulas de Câmara dos Deputados, Assembleia
to e demandam um novo ideário? desempenho já foram estabelecidas, Legislativa, Câmara de Vereadores,
mas, infelizmente, o Supremo Tribu- que é um sistema de voto seriamente
Temos uma democracia eficaz, possí- nal Federal cometeu um erro crasso, comprometido com o poder político e
vel, que é a democracia representati- contra a cidadania, contra a naciona- com o poder econômico...
va. E essa democracia representativa lidade, dando pela inconstitucionali-
se realiza através de partidos políti- dade daquelas cláusulas de barreira O voto distrital poderia ser uma solução?
cos. Mas, se temos partidos que não [em julgamento de 2006].
apresentam programas consistentes, Eu acho que sim. É o voto que deu
que existem somente para dispu- O artigo 1º da Constituição estabelece certo nos Estados Unidos, na França,
tar o quinhão do fundo partidário, a que é fundamento do Estado Brasilei- na Inglaterra, nos países que chama-
sociedade se distancia dos políticos. ro o pluralismo político. Diante disso, mos de civilizados, de primeiro mun-
Isso é ruim, porque não há forma de é mesmo possível estabelecer alguma do. Com o voto distrital, o Congresso
realizar a democracia representativa cláusula de barreira? passaria a ter a cara do eleitorado
que praticamos sem políticos acre- Sem dúvida. No Brasil, há umas seis brasileiro. O nosso sistema propor-
ditados, sem partidos políticos con- ou sete legendas que realmente são cional de listas abertas é um absur-
sistentes. Então, e aí vamos começar partidos políticos. E há mais de vinte do. Isso só é praticado no Brasil e na
a falar em um novo ideário, eu acho partidos que são legendas de aluguel, Finlândia, que tem poucos milhões
que precisamos de uma reforma par- que existem para receber o quinhão de habitantes. Um país continental
tidária. Uma reforma que assegure a do fundo partidário, em detrimento como o nosso, com problemas de
participação de políticos sérios e res- da democracia, da sociedade! Então, toda a sorte, não pode ter esse tipo
peitáveis, que contenha o mínimo de essa reforma partidária é absoluta- de sistema de voto que, além de ser
fidelidade partidária, que estabeleça mente necessária. O sistema de voto difícil de ser praticado, é altamente
cláusula de desempenho ou cláusula comprometido com o poder. Aquele