Page 54 - Revista da Ordem - Edição 35
P. 54

pitoresco
                                 54

2017 | MARÇO | REVISTA dA ORDEM

                                 Vítimas do Juridiquês

                                 por Eduardo Mercer

                                 Existe uma corrente de opera-              algo estranho, obra da minha tres-        uma professora carioca de Direito
                                             dores do direito e um desejo   loucada imaginação, mas prosse-           Administrativo sugeriu um livro do
                                             da sociedade a favor da sim-   gui atento ao queixume da jovem           professor Marçal Jansen – referindo-
                                 plificação da linguagem jurídica. Dian-    senhora. Ao final, ela perguntou se       se naturalmente a Marçal Justen Fi-
                                 te disso, parece que o bom e velhíssimo    tinha como eu conseguir uma cópia         lho, orgulho desta ‘região agrícola do
                                 latinório está saindo de moda, bem         do “formol” de partilha. Respondi         país’ — como disse dias atrás o desde-
                                 como os preciosismos e arcaísmos.          que sim, sem problemas, bastava           nhoso advogado de um ex-presidente
                                                                            assinar uma procuração e eu iria ao       enredado com a justiça.
                                     Mesmo assim, por mais que se           IML, ops, ao Fórum da Família.
                                 facilite, o Direito — como você bem                                                      Outra pérola, digna de encerrar
                                 sabe, caro colega — é feito de termos          Minha cliente, por sua vez, resolveu  esta crônica, ouvi no mesmo curso
                                 técnicos. E aí está o busílis, com o per-  contar que na única audiência da qual     preparatório, contada por um pro-
                                 dão pelo arcaísmo.                         participou ela chamou o juiz de Majes-    fessor de Direito do Trabalho. Disse
                                                                            tade, em vez de Excelência. E percebeu    ele que tinha feito estágio na Cai-
                                     Certo dia apareceu no escritório       que este fez esforço pra não rir.         xa Econômica Federal, onde volta
                                 uma cliente que eu representava em                                                   e meia aparecia algum trabalhador
                                 uma execução de alimentos. Ela le-             Mas nem todos têm tanta imagi-        querendo tirar dúvidas sobre o fi-
                                 vou junto uma amiga que precisava          nação. Os equívocos mais comuns, ao       gêts. Até que um dia ele teve a ideia
                                 tirar uma dúvida. Contou-me essa           menos na área cível, são “usos e fru-     de perguntar ao chefe do setor o que
                                 amiga que o pai tinha falecido há          tos”, no lugar de usufruto, e “uso cam-   seria o tal figêts. Respondeu o espi-
                                 alguns anos, havia sido feito o in-        peão”, no lugar de... você sabe.          rituoso chefe, já conhecedor do ne-
                                 ventário mas a mãe dela não queria                                                   ologismo: “Encaminha pro setor do
                                 lhe mostrar o “formol” de partilha.            Vale admitir que esses erros não      FGTS, lá eles devem saber”.
                                 Por um instante achei que ouvira           são exclusivos dos leigos. Há mui-
                                                                            tos anos, em um curso preparatório,
   49   50   51   52   53   54   55   56   57   58   59