Page 8 - Revista da Ordem - Edição 37
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entrevista: VERA KARAM DE CHUEIRI
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2017 | maio | REVISTA dA ORDEM Na sua opinião, sendo professora de
Direito Constitucional, qual é o pa-
pel da Universidade, especialmente Não é porque, festação de estudantes que resul-
das ciências jurídicas, neste atual em tese, se trata tou na ação do Exército e da Polícia
momento de crise ética e moral que de um curso cuja Militar no Centro Politécnico e na
assola o país? estrutura custa pouco que Reitoria, o secretário de Segurança
deva ser ofertado de Pública era o professor José Mu-
Nosso papel é fundamental. A Uni- qualquer maneira. Temos nhoz de Melo, aqui do nosso setor.
versidade e, sobretudo, a faculdade que parar de tomar como O que preservou os alunos de sofre-
de Direito têm que garantir as con- dado aquele velho ditado rem qualquer tipo de violência foi
dições da democracia. Isso significa de que o curso de Direito uma triangulação importante que
garantir o espaço de pluralidade, depende de cuspe e giz”. ocorreu entre o governador do Es-
de diálogo, onde os conflitos sejam tado (Paulo Pimentel), o professor
produtivos, o debate de ideias seja que nos tirava da zona de conforto Munhoz de Melo e a liderança do
permanente, haja igual respeito e do nosso corporativismo. Eu estava movimento estudantil. Na faculda-
consideração a todos e a todas. Do lá para julgar um colega, mas esse é de, os professores Sansão José Lou-
ponto de vista da formação profis- um movimento que temos que fazer reiro e Egas Moniz de Aragão, por
sional, ética e moral, nosso papel com tranquilidade e naturalidade. exemplo, mesmo não concordando
também é importantíssimo, porque Outra questão é que o ambiente do com as pautas dos manifestantes,
num ambiente plural e democrático Tribunal de Ética propiciava a dis- foram absolutos em defender a pre-
você tem todas as condições de for- cussão de algumas teses muito in- servação da integridade física dos
mar cidadãs e cidadãos comprometi- teressantes. A partir dessa experiên- estudantes. Ainda que houvesse di-
dos com uma ética pessoal e pública cia tive oportunidade de repensar e vergência entre as ideias e as pau-
robustas. Se a Universidade não tiver rever muitas coisas que ensinava e tas, os professores foram firmes em
esse papel, de formação de sujeitos discutia em sala de aula. entender que havia uma despropor-
comprometidos umbilicalmente cionalidade entre a ação dos estu-
com a democracia, não faz sentido Pouco tempo depois que a sra. assu- dantes e a ação da polícia e do Exér-
pensar a Universidade. Agora, temos miu a direção do setor, em agosto do cito. Para mim, esses são excelentes
que cuidar com a confusão que tem ano passado, a histórica sede da Uni- exemplos que orientaram também a
havido nos últimos tempos entre versidade e da Faculdade de Direito minha forma de agir em face da ocu-
moralidade e moralismo. O discurso foi ocupada por estudantes, no con- pação. Em primeiro lugar, tinha que
moralista não serve, porque não é texto de uma série de manifestações se respeitar a pluralidade de ideias
crítico, trabalha sobre verdades ab- contra as PECs da reforma do ensino entre aqueles que queriam ocupar e
solutas, como se elas devessem pau- médio e da limitação dos gastos pú- aqueles que eram contrários à ocu-
tar toda e qualquer ação. O discurso blicos. Qual é hoje a sua avaliação pação, mas sobretudo preservar to-
da moralidade é o que reconhece as desse episódio? dos os estudantes de qualquer tipo
diferenças, as divergências, sobre- Na época eu disse e volto a lembrar: de violência. Encarei aquele movi-
tudo o igual respeito e considera- não foi a primeira vez que houve mento como mais um momento na
ção para todas as manifestações, de ocupação na Universidade. Houve história da Universidade. Temos
forma que não discrimine aquele que outros episódios. Em maio de 1968, aqui um espaço de diálogo incrível
pensa diferente, que não cale a voz quando ocorreu uma grande mani- que nos permite evitar atitudes ex-
daquele que diverge. Acredito que te- tremas. Essa foi a minha percepção.
mos um constitucionalismo robusto Se tivesse que agir novamente, agi-
o suficiente para superar essa crise, ria da mesma maneira.
mas para isso a Constituição tem que
ser levada a sério. Ela não pode ser
casuisticamente desrespeitada.
A sra. foi por seis anos membro do Tri-
bunal de Ética e Disciplina da OAB Pa-
raná. De alguma forma a experiência
na Ordem dos Advogados auxilia em
suas atuais funções?
Foi um aprendizado enorme, por-
que me dei conta que justamente,
em algum momento, a formação do
profissional do Direito se descuidou
desse aspecto ético e moral, o que
impacta nessas condutas reprová-
veis que, depois de analisadas pelo
TED, são responsabilizadas e puni-
das. Outra coisa é a questão corpora-
tiva. Nós somos todos corporativos.
Aqui na Universidade somos assim e
não é diferente entre os advogados.
Lá [no Tribunal de Ética e Disciplina]
havia uma dialética interessante em
torno das questões que chegavam e