Page 60 - Revista da Ordem - Edição 43
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60 Cadernos Jurídicos

    Some-se a este fato a crise econômica pela qual passa o     das grandes vozes contrárias à possibilidade de pessoas
país, no qual qualquer estímulo ao investimento passa a ser     jurídicas serem titulares de EIRELIs, “As sociedades
bem vindo (e a possibilidade de exercício individual de uma     estrangeiras têm sistematicamente evitado pedir autorização
atividade com limitação de responsabilidade, inclusive por      para funcionar no Brasil. Com a flexibilização do conceito de
sociedades estrangeiras é, evidentemente, um deles) e           sociedade brasileira pela Emenda Constitucional 6/1995, que
temos o cenário perfeito para a mudança do paradigma.           aboliu a categoria de empresa brasileira de capital nacional,
                                                                elas passaram a constituir sociedades no território nacional,
    Neste cenário, o DREI, através da IN nº38, de 02/03/2017,   normalmente agregando-se a um sócio brasileiro. Sendo-
aprovou um novo Manual de Atos de Registro de Empresa           lhe permitida a criação de EIRELIs, fica removida a última
Individual de Responsabilidade Limitada (Anexo V),              barreira; criam uma pessoa jurídica brasileira totalmente
passando a permitir expressamente que, além de pessoas          autônoma, sem parceiros e formalmente desvinculada da
físicas, também a pessoa jurídica, nacional ou estrangeira,     matriz que, assim, livra-se de responder pelas obrigações que
possa ser titular de uma EIRELI (item 1.2.5, “c”).              contrair em nosso território” (Direito de Empresa: comentários
                                                                aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil, 5ª. ed – São Paulo:
    Perceba-se que não houve qualquer alteração                 Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 126).
legislativa, apenas uma nova interpretação do órgão
máximo de Registro de Empresa sobre o mesmo dispositivo             Outro ponto que Alfredo de Assis Gonçalves Neto já
legal, passando a admitir a criação de EIRELIs por pessoas      destacava é de que, ao se permitir genericamente que
jurídicas, o que antes era por ele mesmo vedado.                pessoas jurídicas possam ser titulares de EIRELIs, “não
                                                                haveria como negar o direito de constituição de tal empresa
    Com absoluta certeza tal mudança de orientação passa        por sociedades simples, dentre elas as cooperativas, ou por
a ser um divisor de águas quanto à criação de EIRELIs no        associações, fundações, partidos políticos e organizações
país (sem qualquer juízo de valor quanto a ser o mesmo          religiosas” (op. cit., p. 126).
positivo ou negativo).
                                                                    Tal mudança de interpretação do DREI poderá, ainda,
    Algumas dúvidas, porém surgem com tal permissão,            estimular que sociedades deixem de criar meras filiais
a começar se seria admitida a criação de uma cadeia             (estabelecimentos secundários, sem personalidade jurídica
sucessiva de EIRELIs. Para tentar corrigir esta distorção       própria) substituindo-as pela criação de EIRELIs. Assim,
o DREI estabeleceu que “A constituição de EIRELI por            cada novo empreendimento, cada novo estabelecimento,
pessoa jurídica impede a constituição de outra com os           seria exercido por uma nova pessoa jurídica (EIRELI) com
mesmos sujeitos naturais integrantes a titular, em respeito ao  patrimônio e responsabilidade próprios e com limitação de
disposto no § 2º do art. 980-A do Código Civil.” (sic.). Ora,   responsabilidade de pessoa jurídica que é sua titular.
tal redação gera incertezas. Uma pessoa física sempre pôde
ser titular de uma EIRELI e, simultaneamente, ser sócio             A EIRELI não teve a adesão que se esperava quando
de uma sociedade. Neste caso, a sociedade de que ele faz        de sua criação pelo legislador, muito mais pela exigência
parte não poderá constituir uma EIRELI? Ou será ele que         de um capital social mínimo, totalmente integralizado,
terá que extinguir a sua, caso a sociedade de que faz parte     no elevado valor de pelo menos 100 (cem) vezes o salário
queira constituir uma EIRELI? Nesta parte, a redação foi        mínimo vigente no país, do que pela restrição à sua
extremamente infeliz.                                           criação por pessoas físicas. Como já exposto, a EIRELI foi
                                                                idealizada para permitir ao empresário individual, pessoa
    Ao se admitir a constituição de EIRELIs por pessoa          física, a criação de uma pessoa jurídica com limitação de
jurídica estrangeira (talvez o principal foco da mudança, para  responsabilidade, empresário este que normalmente não
o estímulo do ingresso de novos capitais no País), não haveria  possui ou não tem necessidade de tal montante como
mais o porquê de observar todas as normas para autorização      investimento inicial.
de funcionamento de sociedade estrangeira em território
nacional (dentre elas as constantes da IN nº07/2013 do              Agora, com a mudança de orientação do DREI,
DREI). Além de fazer letra morta os requisitos para a criação   espera-se um incremento significativo na constituição de
de uma subsidiária integral (sociedade anônima prevista no      EIRELIs no País, que passarão a ser criadas facilmente por
art. 251 da Lei 6.404/76, que tem como requisito ter como       sociedades estrangeiras (observada a IN DREI 34/2017) e
único acionista uma sociedade brasileira), pois poderia se      por tantas outras sociedades brasileiras, como verdadeiras
chegar ao mesmo resultado através de uma EIRELI.                “subsidiárias integrais” sob a forma de EIRELI.

    Nas palavras de Alfredo de Assis Gonçalves Neto, uma

expediente      Coordenador:                                    * Os artigos são de responsabilidade dos respectivos
                Fernando Previdi Motta                          autores. Foram enviados como instrumento de colaboração
ISSN 2175-1056  Advogado inscrito na OAB                        para o debate acerca dos temas escolhidos e não
                Paraná sob nº 25.335                            representam necessariamente a opinião da OAB Paraná.
                                                                ** Esta edição contou com a colaboração da Comissão
                                                                de Direito Empresarial da OAB Paraná
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