Page 59 - Revista da Ordem - Edição 43
P. 59
Cadernos Jurídicos 59
A PESSOA JURÍDICA Gustavo Teixeira
COMO TITULAR V i l l ato r e
DE EIRELI: A NOVA Advogado inscrito na
ORIENTAÇÃO DO DREI OAB-PR sob o nº 25658
(IN DREI 38/2017 – Mestre em Direito
Anexo V) de Empresa pela PUC/PR
Vice-Presidente da Comissão de
Direito Empresarial da OAB/PR
Professor de Direito Societário
da Universidade Positivo
AEmpresa Individual de Responsabilidade Limitada único, Lei 479/08), e Portuguesa (que através do Decreto
(EIRELI) foi criada através da Lei 12.441/2011, que 286/86 passou a prever o Estabelecimento Individual de
acrescentou o art. 980-A no Código Civil Brasileiro, Responsabilidade Limitada), dentre outras.
bem como acrescentou sua previsão dentre as pessoas jurí-
dicas de direito privado no art. 44 do mesmo Código. O próprio Projeto de Lei que deu origem à nossa
EIRELI (PL nº4605/2009) previa, em sua redação original e
Desde a sua criação, uma questão sempre foi objeto de justificativa, a expressa limitação de sua criação por pessoa
discussão acalorada: a possiblidade ou não de uma pessoa natural, sendo que em sua redação final acabou por constar
jurídica ser titular de uma EIRELI. Tal discussão decorre a expressão “por uma única pessoa”.
da redação dada ao caput de referido art. 980-A CC, o
qual dispõe que “A empresa individual de responsabilidade O §2º do art. 980-A do CC prevê a restrição de que
limitada será constituída por uma única pessoa titular da “A pessoa natural que constituir empresa individual de
totalidade do capital social, devidamente integralizado, que responsabilidade limitada somente poderá figurar em uma
não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo única empresa dessa modalidade.”. O que não demonstraria
vigente no País.” Ao não individualizar a que “pessoa” se lógica restringir o direito de uma pessoa natural em
refere, seria possível uma interpretação literal e extensiva constituir apenas uma EIRELI, enquanto se admitisse que a
de que tanto pessoas físicas quanto jurídicas poderiam ser pessoa jurídica pudesse constituir quantas quisesse.
titulares de uma EIRELI.
Em razão de tais ponderações, por ocasião da V
Todavia, não foi este o entendimento que havia Jornada de Direito Civil do Centro de Estudos Judiciários
prevalecido, até recentemente. Isto porque o instituto do Conselho da Justiça Federal, foi elaborado o Enunciado
da EIRELI foi concebido para organizar juridicamente nº 468, sob a coordenação da Professora Ana Frazão, que
a atividade econômica do empreendedor individual, expressamente concluiu que “A empresa individual de
permitindo-lhe, como pessoa física, criar um ente jurídico responsabilidade limitada só poderá ser constituída por
abstrato, com limitação de responsabilidade. Limitação de pessoa natural”.
responsabilidade esta que, até o advento da EIRELI, só era
concebida através da criação de certos tipos societários O próprio DNRC (posteriormente substituído pelo
(como a Sociedade Limitada e a Sociedade Anônima). DREI), após a criação da EIRELI, editou a IN 117/2011, ao
Uma forma de acabar com as tradicionais sociedades aprovar o Manual de Atos de Registro de Empresa Individual
Limitadas entre dois sócios, onde um tem mais de 99% de Responsabilidade Limitada, adotou tal corrente e dispôs
das quotas sociais e o outro menos de 1%, apenas para de modo expresso que “Não pode ser titular de EIRELI a
atender à exigência da pluralidade de sócios para criação pessoa jurídica, bem assim a pessoa natural impedida por
da sociedade. norma constitucional ou por lei especial.”. Por sua vez, com a
criação do DREI, o mesmo editou a IN 10/2013, repetindo
Dentre os argumentos para a restrição da constituição a orientação de que pessoas jurídicas não poderiam ser
de uma EIRELI apenas por pessoas físicas estava o fato titulares de EIRELIs.
de que a legislação comparada que a inspirou, também
limita expressamente sua criação à pessoa física, tal Apesar de todas as considerações acima expostas,
como a Chilena (Art. 1º da Lei 19.857/2003), a Paraguaia diversas medidas judiciais foram ajuizadas buscando a
(art. 15 da Lei 1.034/1983), a Peruana (Art. 4º do Decreto- autorização para o registro de EIRELIs tendo como único
lei 21.621/1976), a da Costa Rica (Art. 9º, Código de titular uma pessoa jurídica. Algumas tiveram sucesso, com
Comércio), a da República Dominicana (art. 450 e parágrafo base na interpretação literal do caput do art. 980-A do CC,
que não faz expressa menção à restrição de sua criação por
pessoas físicas.