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Cadernos Jurídicos 57
A Constituição Zulmar Fachin
de 1988: o
Advogado inscrito na OAB/PR sob n.º 12748
desafio da Bacharel em Direito (UEM)
conservação
Doutor em Direito Constitucional (UFPR)
Mestre em Direito (UEL)
Mestre em Ciências Sociais (UEL)
Estudou Ciência Política e Direitos
Humanos no Doutorado da USP
Professor de Direito Constitucional
na UEL, no UniCesumar (Mestrado)
e nas Faculdades Londrina
Presidente do IDCC - Instituto de
Direito Constitucional e Cidadania
Membro da Academia
Paranaense de Letras Jurídicas
Oobjetivo do texto é refletir sobre a efetividade serem engavetadas à espera de intérpretes que de-
das Constituições brasileiras e a preservação moravam a chegar e, quando apareciam, muitas vezes
da Constituição de 1988. Parte-se da premis- vinham deturpá-las.
sa segundo a qual o histórico do nosso constitucio-
nalismo é marcado por fraca observância das normas Tivemos sete Constituições, das quais três foram
constitucionais, embora, à luz da Constituição de impostas ao povo com a finalidade de manter o con-
1988, tenha havido algum progresso. trole do poder estatal nas mãos de grupelhos autoritá-
rios. Foi assim em 1824, quando D. Pedro I extinguiu a
Nascida a 5 de outubro de 1988 (após uma espera Assembléia Nacional Constituinte com a justificativa
de quase um quarto de séculos), a Constituição Cida- de que esta não estava elaborando uma Constituição
dã ainda é pouco conhecida do brasileiro comum. E que fosse digna do povo e dele, Imperador (!!!). Poucos
se é verdade que a década de 1990 marcou o início do dias depois, Sua Majestade outorgou uma Carta Cons-
estudo do Direito Constitucional no Brasil, não é me- titucional, feita de encomenda por um grupo que lhe
nos verdade que, na prática, os valores que a Consti- era submisso e representava o poder dos marqueses,
tuição consagra permanecem à espera de intérpretes duques, barões, condes e viscondes.
que possam efetivá-los.
Foi assim também em 1937, quando Getúlio Var-
Quando a Constituição foi promulgada, o presi- gas, no amanhecer do dia 10 de novembro, pelo rádio,
dente da Assembléia Nacional Constituinte expres- anunciou ao povo uma nova Carta Constitucional e,
sava o entusiasmo geral: “Chegamos! Esperamos a com base nela, implantou o que chamou de Estado
Constituição como o vigia espera a aurora. A per- Novo. E não foi diferente em 1967, quando os mili-
sistência da Constituição é a sobrevivência da De- tares outorgaram uma Carta Constitucional cuja fi-
mocracia (...) que este Plenário não abrigue outra nalidade era dar contornos de legitimidade ao golpe
Assembléia Nacional Constituinte. Porque antes da de 1964, com o qual haviam soterrado a Constituição
Constituinte, a ditadura já teria trancado as portas redemocratizadora de 1946.
desta Casa” (Sessão Solene de Promulgação da Cons-
tituição da República Federativa do Brasil. Revista Mas o problema é ainda mais grave se observar-
de Informação Legislativa. Brasília: Senado Federal, mos que, das sete Constituições brasileiras, nenhuma
1988, n. 100, p. 6 e 12). foi efetivada. Outorgadas ou promulgadas, nenhuma
delas foi verdadeiramente aplicada. A ausência de efe-
Não se pode dizer que a partir da nova Constitui- tividade das Constituições brasileiras foi constatada
ção nada tenha mudado; ao contrário, muitas foram por Manoel Bonfim ainda em 1931, um ano antes da
as transformações promovidas pelo novo texto cons- morte desse constitucionalista esquecido: “Com Pedro
titucional. Mas é preciso admitir que ela continua I se iniciou, no Brasil, o costume, que já é tradição, de
sendo tratada como uma espécie de filho enjeitado. haver Constituição para não ser cumprida. Nunca o foi
E as causas, talvez, devamos buscá-las em nosso pró- a do Império, como nunca o foi a da República, e nes-
prio passado. sa mentira essencial vive a nação brasileira.” (O Brasil
Nação: realidade da soberania nacional, 2. ed., Rio de
O Direito Constitucional brasileiro tem sido, ao Janeiro: Topbooks, 1996, p. 103).
longo da História, um grande mal-entendido. Golpes
de Estado dos mais variados quilates; Cartas Consti- Torna-se necessário reconhecer, no entanto, que a
tucionais outorgadas para garantir o poder nas mãos Constituição de 1988 tem servido de marco protetor dos
de pequenos grupos autoritários; Constituições pro- direitos fundamentais das pessoas. Neste sentido, con-
mulgadas com muita pompa para, logo em seguida, servá-la é um desafio que se impõe a todos os brasileiros.