Page 10 - Revista da Ordem - Edição 25
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entrevista

Essa mudança de mentalidade é fun-        sanar os vícios processuais. Isso é muito  ridade à prestação judicial. A Sra.
damental para que o novo CPC fun-         importante. Ninguém vai ao Judiciário      acredita que o novo CPC vai tornar
cione, não?                               para esperar dois ou três anos e depois    a Justiça mais célere?
Sem uma mudança cultural, o Código        ter uma sentença terminativa sem de-       Não, não acredito, porque o nosso pro-
não vai ter aplicação prática. Se nós     cisão de mérito porque houve alguma        blema de celeridade, hoje, não é da lei.
simplesmente dissermos que é impos-       falha processual, carência de ação, falta  O problema da ausência de celeridade
sível fundamentar as decisões judiciais   de algum pressuposto processual. Ago-      é da falta de estrutura. O Poder Judici-
como prescreve o CPC, nós faremos         ra, a tendência da lei é implementar um    ário não tem estrutura suficiente para
letra morta de um novo dispositivo que    sistema em que tudo pode ser sanado, à     atender todas as demandas. Lá no iní-
é tão importante. É difícil, sem dúvida,  exceção da intempestividade, justamen-     cio se pensou que o novo CPC poderia
mas nós devemos lutar para pelo menos     te para que o juiz analise o mérito, a     solucionar isso e hoje nós vemos, antes
implementar aquilo que o Código tem       questão de fundo, o direito material. O    mesmo da entrada em vigor do Código,
de mais importante, que é esse caráter    artigo 4º do novo CPC diz que as partes    que a celeridade não será algo possível
dialógico. Se o advogado trouxe um        têm direito a um julgamento de mérito      apenas através da mudança da lei. É
argumento, esse argumento deve ser        em tempo razoável. Essa preocupação        necessária também uma mudança cul-
considerado pelo magistrado. O con-       com o julgamento de mérito é muito         tural, como já mencionado, inclusive
traditório deve ser com poder de influ-   importante. O Código combate a juris-      do ponto de vista de as partes buscarem
ência, efetivo, não aquele contraditório  prudência defensiva, aqueles obstáculos    também a conciliação, a mediação, de
meramente formal, em que o juiz abre      que os tribunais superiores impunham       tentarem resolver realmente o litígio ao
vista para as partes, as partes se mani-  para evitar o conhecimento dos recur-      invés de só protelar os processos.
festam e, na sequência, isso não é nem    sos. Há caso em que a guia de custas
considerado. Esse é um modelo que não     estava borrada e não se conheceu do        A par da questão da celeridade, o novo
pode mais persistir.                      recurso! Veja a que ponto nós chega-       CPC surgiu com a intenção de fazer
                                          mos! É como se houvesse uma indife-        uma simplificação recursal, inclusive
Atualmente, grande parte das ações        rença do Poder Judiciário em relação       com a supressão de recursos. Houve
judiciais é resolvida com base em         ao direito material da parte! Agora, é     essa simplificação?
questões estritamente processuais, que    possível corrigir todos os defeitos, in-   Não. Aliás, um problema que eu vejo
se sobrepõem ao próprio direito. O        clusive nos recursos, para permitir que    no Código é a questão dos embargos
novo CPC procura resolver isso?           o julgamento de mérito seja feito. Isso    infringentes, aquele recurso quando não
Sim. Depois da ideia de uma jurispru-     é muito positivo.                          há decisão unânime na fase de apela-
dência mais estável, na minha visão, o                                               ção, por exemplo. Agora, ao invés da
segundo ponto mais importante do novo     Desde o anteprojeto, diz-se que a          interposição de embargos infringentes,
Código é justamente a primazia do jul-    ideologia norteadora para a criação        haverá uma continuidade do julgamen-
gamento de mérito. O Código procura       do novo Código foi dar mais cele-          to caso a decisão não seja unânime,
                                                                                     convocando-se mais membros para jul-
                                                  Sem uma mudança                    garem aquele recurso. Então, ao invés
                                                  cultural, o                        de simplificar, de melhorar, parece-me
                                          Código não vai ter                         que piorou, porque haverá um recurso
                                          aplicação prática. Se nós                  de ofício em todos os casos em que a
                                          simplesmente dissermos                     decisão não for unânime. Acho que isso
                                          que é impossível                           vai gerar mais atraso ainda.
                                          fundamentar as decisões
                                          judiciais como prescreve                   Mudou também a forma de recorri-
                                          o CPC, nós faremos                         bilidade de decisões interlocutórias,
                                          letra morta de um novo                     por meio de agravo de instrumento,
                                          dispositivo que é tão                      correto?
                                          importante                                 Sim. Em relação ao agravo de instrumen-
                                                                                     to, agora ele só será cabível nas hipóteses
                                                                                     taxativas do artigo 1.015 do novo CPC.
                                                                                     Ou seja, todas as outras questões não
                                                                                     abrangidas pelos incisos do art. 1.015 de-
                                                                                     vem ser trazidas na fase de apelação. A
                                                                                     ideia do Código foi muito boa, no senti-
                                                                                     do de deixar para análise posterior o que
                                                                                     não é de relevância fundamental para o
                                                                                     processo e, com isso, diminuir o volume

10 | março | 2016 | REVISTA dA ORDEM
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